Caracterização estrutural e funcional dos efeitos do tratamento com hidroxicloroquina na retina

Abstract

Introdução: A retinopatia por hidroxicloroquina é uma complicação reconhecida do tratamento prolongado com este fármaco, podendo conduzir a perda visual irreversível, sendo essencial a deteção precoce da toxicidade. Este estudo teve como objetivo a avaliação da influência do tratamento com hidroxicloroquina no campo visual central e na espessura das camadas retinianas obtida após segmentação com o spectral-domain optical coherence tomography (SD-OCT). Métodos: Estudo retrospetivo transversal. Foram incluídos doentes referenciados para rastreio de retinotoxicidade da hidroxicloroquina e excluídos doentes com glaucoma ou patologia da retina. Todos os doentes foram submetidos a avaliação oftalmológica completa, SD-OCT e perimetria computorizada dos 10º centrais. Efetuou-se segmentação automática dos scans de SD-OCT de forma a obter a espessura de cada camada da retina. O complexo de células ganglionares resultou da combinação das camadas de fibras nervosas, células ganglionares e plexiforme interna. Os doentes foram divididos em dois grupos, um que incluiu os doentes com menos de 5 anos de tratamento (Grupo A) e outro com os doentes com pelo menos 5 anos de tratamento (Grupo B), representando, respetivamente, os efeitos de curto e longo-prazo do tratamento com hidroxicloroquina. Resultados: Foram incluídos neste estudo 179 olhos de 93 doentes (Grupo A: 49 olhos; Grupo B: 130 olhos), com idade média de 55,8712,92 anos e predominância do sexo feminino (84,92%). A duração média do tratamento foi de 8,365,11 anos, com uma dose diária por peso corporal real de 5,071,54 mg/kg, totalizando uma dose cumulativa de 1014,78675,93 gramas de hidroxicloroquina. Os grupos eram semelhantes no que concerne à idade e sexo (p>0,05). A espessura total da retina foi significativamente menor no grupo B relativamente ao grupo A (314,4616,30 contra 308,4413,71; p=0,014). No grupo B, os setores parafoveais do complexo de células ganglionares apresentaram correlação inversa significativa com a dose cumulativa total (r=-0,32; p<0,001). Ajustando para a idade (=-0,111; p=0,267), sexo feminino (=-0,259; p=0,006) e equivalente esférico (=0,245; p=0,014), a espessura parafoveal do complexo de células ganglionares diminuiu 0,004 m por cada grama de aumento na dose cumulativa de hidroxicloroquina (R-quadrado = 15,73%). A espessura da retina externa parafoveal, assim como os índices sumários dos campos visuais, foram semelhantes entre os grupos e não apresentaram correlação com a dose cumulativa. Conclusão: Doses cumulativas crescentes de hidroxicloroquina podem induzir diminuição progressiva da espessura da retina interna parafoveal, particularmente do complexo de células ganglionares. Os índices sumários dos campos visuais não refletiram, neste estudo, os efeitos de longo-prazo da hidroxicloroquina.

Introduction: Hydroxychloroquine retinopathy is a recognized complication of the prolonged treatment with this drug, leading to irreversible visual loss, being essential the early detection of toxicity. The purpose of this study was to evaluate the influence of the treatment with hydroxychloroquine on the central visual field and on the retinal layers thickness after segmentation with spectral-domain optical coherence tomography (SD-OCT). Methods: Retrospective, cross sectional study. The patients referred for hydroxychloroquine retinopathy screening were included and patients with glaucoma or retinal diseases were excluded. All patients underwent a complete ophthalmological examination, SD-OCT and central visual field testing. Automatic segmentation was performed using the SD-OCT software, so that the thickness of each retinal layer was obtained. The ganglion cell complex was obtained by the combination of the nerve fiber, inner plexiform and ganglion cell layers. Patients were divided in two groups, one including patients with less than 5 years of treatment (Group A) and other including patients with at least 5 years of treatment with hydroxychloroquine (Group B), representing, respectively, the short and long-term effects of the treatment. Results: In this study, 179 eyes from 93 patients were included (Group A: 49 eyes; Group B: 130 eyes), with a median age of 55,8712,92 years and female sex predominance (84,92%). The median duration of treatment was 8,365,11 years, with a daily dose by real body weight of 5,071,54 mg/kg, totaling a cumulative dose of 1014,78675,93 g of hydroxychloroquine. Both groups were similar regarding age and sex (p>0,05). Total retinal thickness was significantly thinner in group B comparing to group A (314,4616,30 vs. 308,4413,71; p=0,014). In group B, the inner sectors of the ganglion cell complex showed a significant inverse correlation with total cumulative dose (r=-0,32; p<0,001). After adjusting for age (=-0,111; p=0,267), female sex (=-0,259; p=0,006) and spherical equivalent (=0,245; p=0,014), parafoveal thickness of the ganglion cell complex decreased 0,004 m for each gram increase on the hydroxychloroquine cumulative dose (R-squared = 15,73%). The parafoveal outer retina, as well as the summary indices of the visual fields, were similar between groups and did not correlate with cumulative dose. Conclusion: Increasing cumulative doses of hydroxychloroquine can induce progressive thinning of the parafoveal inner retina, particularly of the ganglion cell complex. In this study, the summary indices of the visual fields did not reflect the long-term effects of hydroxychloroquine.