Mudança de atitude da mulher durante a Interrupção Voluntária da Gravidez: quais os potenciais efeitos no feto?

Abstract

Introdução: A nível mundial, aproximadamente 25% das gravidezes terminam por recurso a técnicas de aborto. Em 2007, Portugal despenalizou a Interrupção da Gravidez por opção da mulher até às 10 semanas de gestação, passando a integrar o conjunto de países europeus onde o acesso ao aborto seguro é garantido. Encontram-se disponíveis os métodos medicamentoso e cirúrgico, sendo que o medicamentoso corresponde a 98% das interrupções realizadas no âmbito do Serviço Nacional de Saúde. A decisão de interrupção de gravidez é um processo biopsicossocial complexo, em que podem surgir mudanças de atitude em qualquer uma das fases do processo, que podem ocorrer por diversas razões, entre as quais pressão exercida por terceiros.Objetivos: Avaliação dos efeitos teratogénicos resultantes do regime terapêutico da Interrupção Voluntária da Gravidez, de modo a fundamentar o aconselhamento perante uma mudança de atitude. Métodos: Revisão da literatura, com base nos artigos publicados nos últimos 5 anos na plataforma “Pubmed”, em inglês. Foram incluídos artigos de revisão, estudos randomizados e outros considerados clinicamente relevantes para a discussão. Resultados: É consensual que o mifepristone não exerce efeitos teratogénicos, não estando associado a um risco elevado de malformações congénitas. Contudo, a administração de misoprostol está associada a um espetro clínico reconhecido de malformações, possuindo um risco absoluto de aproximadamente 1%, que inclui condições como Síndrome de Moebius, Síndrome da Banda Amniótica e defeitos nos membros e extremidades, destacando-se o pé boto. Conclusão: A mudança de atitude durante o processo de interrupção de gravidez é um acontecimento raro, porém não é isenta de riscos, que devem ser adequadamente transmitidos à mulher. O uso de mifepristone não se associa a teratogenicidade, contudo o mesmo não se verifica com o misoprostol. A mulher deve receber acompanhamento em função da fase em que a mudança de atitude ocorreu. Se a mulher deseja continuar a gravidez após o uso de misoprostol, deve ser disponibilizada uma vigilância pré-natal em centro de apoio perinatal diferenciado.

Introduction: Nearly 25% of pregnancies worldwide end by using abortion techniques. In 2007, Portugal decriminalized termination of pregnancy by woman’s choice until 10 weeks of gestation, becoming part of the group of the European countries where access to secure abortion is guaranteed. There are two available methods: the drug and the surgical one, being the drug method used in 98% of the terminations done within the scope of the National Health Service. The decision of terminating a pregnancy is a complex biopsychosocial process, during which can occur mind changes towards any of the process phases that can be caused by many reasons, like for example pressure exerted by third parties.Objectives: Evaluation of the teratogenic effects resulting from the voluntary termination of pregnancy’s therapeutic regimen, in order to substantiate the counseling towards a mind change.Materials and Methods: Literature review, based on articles published in the last five years on the internet platform ‘Pubmed’, in English. Review articles were included, randomized controlled trials and other considered to be clinically relevant for the discussion.Results: It is consensual that mifepristone does not cause teratogenic effects, not being associated with a high risk of congenital malformations. However, the administration of misoprostol is linked with a recognized clinical spectrum of malformations that has an absolute risk of 1%, which includes Moebius Syndrome, Amniotic Band Syndrome and limb defects, with particular attention to club foot. Conclusions: Mind change during the process of termination of pregnancy is a rare occurrence, however it is not free of risks, and they should be properly communicated to the woman. Mifepristone has no teratogenic effects, but the situation is not the same with misoprostol. The woman should receive a proper monitoring regarding the phase in which the mind change took place. If the woman wishes to keep the ongoing pregnancy after the use of misoprostol, prenatal surveillance in a specialized perinatal center should be offered.