IMPACTO DA ACUSAÇÃO DE FEITIÇARIA NO PROCESSO DE (RE)CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA: Experiências de crianças e jovens a residir nos lares de acolhimento de Malanje

Abstract

This dissertation aims to analyse, in an exploratory way, the impact of the accusation of witchcraft on the process of identity (re)construction of children and young people living in the foster homes of Malanje, a region where the Bantu culture is very present. The Bantu believes that all diseases, deaths, and misfortunes are caused by human action, in the person of the sorcerer (Morisca, 2003), "who personifies wickedness". (Altuna, 2014, p. 589). The phenomenon of children/young people accused of witchcraft in Angola has received special attention from state organizations and non-governmental organizations (NGOs), especially since 2001, when numerous cases of children accused of witchcraft were detected on the streets of Mbanza Kongo, as well as in other regions of the country. In view of these facts, partnerships were created between the National Institute for Child Support (INAC) and several NGOs that in 2003 promoted the creation of partnerships between INAC with the NGOs Save the Children - Norway Section (SC-N) and Christian Children Fund (CCF), which promoted the implementation of a child protection network. Despite these efforts, today, cases of children/young people accused of witchcraft, rejected by their families, living on the streets and in foster homes are still visible in every Angolan reality. Due to the exposure to risk/danger, in 2012 the Angolan State approved the Law for the Protection and Integral Development of Children (Law No. 25/12, of 22 August), which in general presents the general principles for the protection of children and especially their reception.The empirical study aims to understand the influence of the accusation of witchcraft in the process of identity (re)construction of children and young people living in foster homes, as well as to understand the social intervention carried out in order to act on the negative impact on subjects accused of witchcraft to ensure the identity (re)construction of children/young people. This is a qualitative exploratory study, based on the inductive method, using semi-structured interviews. In the context of two Foster Homes in the province of Malanje-Angola, three samples were constituted, of the non-probabilistic intentional or trial type: (a) Children/young people accused of witchcraft inserted in foster homes; (b) social workers who work directly with these children, and; (c) child and youth policy-makers, totalling 10 participants. We conclude that the accusation of witchcraft exerted a negative influence on the process of identity (re)construction of children and young people, with a life trajectory marked by feelings of sadness, discouragement and apathy, combined with deviant behaviors (e.g., theft) as a way to survive before being integrated into foster homes.

A presente dissertação visa analisar, de forma exploratória, o impacto da acusação de feitiçaria no processo de (re)construção identitária das crianças e jovens a residir nos lares de acolhimento de Malanje, região onde a cultura Bantu está muito presente. O bantu acredita que todas doenças, mortes e desgraças são causadas por ação humana, na pessoa do/a feiticeiro/a (Morisca, 2003), “o qual personifica a maldade” (Altuna, 2014, p. 589). O fenómeno das crianças/jovens acusados de feitiçaria em Angola mereceu especial atenção das Organizações estatais e das Organizações não Governamentais (ONGs), sobretudo a partir de 2001, quando foram detetados inúmeros casos de crianças acusadas de feitiçaria, nas ruas de Mbanza Kongo, bem como em outras regiões do país. Perante tais fatos, foram criadas parcerias entre o Instituto Nacional de Apoio à Criança (INAC) e várias ONGs que em 2003, impulsionou a criação de parcerias entre o INAC com as ONGs Save the Children - Seção Noruega (SC-N) e Christian Children Fund (CCF), que promoveu a implementação de uma rede de proteção da criança. Apesar desses esforços, hoje, ainda é visível em toda realidade angolana casos de crianças/jovens acusados de feitiçaria, rejeitados pela família, residindo nas ruas e em lares de acolhimento. Em função da exposição ao risco/perigo, em 2012 o Estado angolano aprova a Lei da Proteção e Desenvolvimento Integral da Criança (Lei n.º 25/12, de 22 de agosto), que de modo geral, apresenta os princípios gerais para a proteção das crianças e sobretudo o acolhimento destas.O estudo empírico visa compreender a influência da acusação de feitiçaria no processo de (re)construção identitária das crianças e dos jovens residente em lares de acolhimento, bem como compreender a intervenção social efetuada no sentido de atuar no impacto negativo nos sujeitos acusados de feitiçaria para garantir a (re)construção identitária das crianças/jovens. Trata-se de um estudo exploratório qualitativo, assente no método indutivo, com recurso a entrevista semiestruturada. Tendo como contexto dois Lares de Acolhimento da província de Malanje-Angola, foram constituídas três amostras, do tipo não probabilística intencional ou por julgamento: (a) Crianças/jovens acusados de feitiçaria inseridos em lares de acolhimento; (b) interventores/as sociais que trabalham diretamente com estas crianças, e; (c) responsáveis políticos em matéria da infância e juventude, totalizando 10 participantes. Concluímos que a acusação de feitiçaria exerceu uma influência negativa no processo de (re)construção identitária das crianças e jovens, tendo estes uma trajetória de vida marcados por sentimentos de tristeza, desânimos e apatia, aliados a comportamentos desviantes (e.g., furto) como forma de sobreviver antes de serem integrados em lares de acolhimento. Palavras-chave: Cultura Bantu; acusação de feitiçaria; crianças e jovens; lares de acolhimento; processo de (re)construção identitária.