Impacto da Pandemia de COVID-19 no Consumo de Psicofármacos: Série Temporal Interrompida

Abstract

O surgimento do SARS-CoV-2 levou à imposição de medidas de restrição e confinamento severas em quase todo o mundo de forma a mitigar a sua transmissão. Estas medidas condicionaram drasticamente a vida da sociedade, tendo originado repercussões a nível sanitário, económico, social e demográfico. Estas alterações, aliadas ao desconhecimento acerca desta nova doença e número crescente de mortes, contribuíram para um aumento generalizado dos níveis de stress na comunidade. Assim, a pandemia de COVID-19 pode ter constituído um fator de risco para a saúde mental da população. Adicionalmente, Portugal é um país com elevada prevalência de perturbações psiquiátricas, sendo a depressão uma das principais causas de incapacidade dos portugueses, e um dos países da Europa com maior consumo de antidepressores. Posto isto, o objetivo deste estudo foi caracterizar o consumo de antidepressores na Administração Regional de Saúde (ARS) do Centro, I.P. e avaliar o impacto que a pandemia de COVID-19 teve neste consumo. Assim, procedeu-se a uma análise descritiva do consumo destes fármacos para o período temporal compreendido entre 2010 e 2021. Para determinar o impacto causal da pandemia neste consumo, analisou-se a série temporal interrompida (STI) do consumo mensal de antidepressores, expresso em Dose Diária Definida, recorrendo a um modelo de análise com estrutura Bayesiana. Todas as análises foram efetuadas com diferentes níveis de granularidade: ao nível da ARS do Centro, dos seus Agrupamentos de Centros de Saúde e municípios. Adicionalmente, realizou-se uma análise bivariada de forma a identificar as características que se associam à tendência e efeito da pandemia no consumo de antidepressores. Os resultados desta análise demonstraram uma tendência secular crescente no consumo destes fármacos na ARS do Centro, tendo-se constatado a existência de discrepâncias significativas no consumo entre os diferentes municípios da ARS do Centro. Identificou-se uma correlação negativa entre o consumo de antidepressores e o número de habitantes por centro de saúde. A análise da STI na ARS do Centro não revelou um impacto significativo da pandemia no consumo de antidepressores. No entanto, a análise com maior nível de granularidade permitiu detetar um aumento significativo do consumo em 44% dos municípios da ARS após o aparecimento da pandemia. Este incremento correlacionou-se de forma positiva com a percentagem da população com idade superior a 65 anos e de forma negativa com a densidade populacional.

The emergence of SARS-CoV-2 led to the imposition of severe restriction and lockdown measures across the world in order to mitigate the transmission of the virus. These measures drastically conditioned people’s daily routines, having had repercussions at a health, economic, social and demographic level. These changes, combined with the lack of knowledge about this new disease and the growing number of deaths, contributed to a generalized increase in the levels of stress in the community. Thus, the COVID-19 pandemic may have posed a risk factor for the mental health of the population. Additionally, Portugal is a country with a high prevalence of psychiatric disorders, with depression being one of the main causes of disability among portuguese people, and one of the European countries with the highest consumption of antidepressants. Hence, the aim of this study was to characterize the consumption of antidepressants in the Regional Health Administration of the Center, I.P (ARSC) and to evaluate the impact of the COVID-19 pandemic on this consumption. A descriptive analysis of the consumption of these drugs was carried out for the time period between 2010 and 2021. An interrupted time series (ITS) analysis of the monthly consumption of antidepressants, expressed in Defined Daily Dose, was conducted using Bayesian structural time-series models to infer the causal impact of the pandemic on this consumption. All analyses were performed with different levels of granularity: at the level of the ARSC, its Groups of Health Centers and municipalities. Furthermore, a bivariate analysis was carried out in order to identify the characteristics associated with the trend and effect of the pandemic on the consumption of antidepressants. The results of the analysis revealed an increasing secular trend in the consumption of these drugs in the ARSC, as well as significant discrepancies in the consumption between the different municipalities of the ARSC. A negative correlation was identified between the antidepressant consumption and the population per health center. The ITS analysis in ARSC did not reveal a significant impact of the pandemic on the antidepressant consumption. However, the analysis with higher granularity identified a significant increase of antidepressant consumption in 44% of the municipalities after the pandemic onset. This increment positively correlated with the percentage of the population aged over 65 and negatively with population density.