Doença de Refluxo Gastroesofágico e Vigilância do Esófago de Barrett

Abstract

A Doença de Refluxo Gastroesofágico é uma das patologias mais relevantes na prática clínica gastrenterológica. A sua prevalência global estimada é de 8% a 33%, com tendência a aumentar, numa intrínseca associação ao estilo de vida ocidental.Ocorre primariamente como um distúrbio a nível do esfíncter esofágico inferior, tendo como mecanismo fisiopatológico mais importante a ocorrência involuntária de episódios transitórios de relaxamento deste esfíncter.A exposição continuada da mucosa esofágica ao ácido gástrico propicia inflamação na mucosa esofágica e alterações celulares com potencial de malignização, nomeadamente sob a forma de adenocarcinoma esofágico. O Esófago de Barrett ocorre tipicamente como complicação crónica desta doença (sobretudo se prolongada ou não tratada) e consiste na substituição do epitélio pavimentoso do esófago distal por epitélio cilíndrico com células caliciformes (metaplasia intestinal). Identifica-se em 7-10% dos doentes com Doença de Refluxo Gastroesofágico crónica e em 1-2% da população adulta europeia.Surge como condição pré-neoplásica de alto risco e representa um risco 30-40 vezes superior de adenocarcinoma (face à população geral), requerendo por isso um diagnóstico atempado e um seguimento regular mediante protocolos de vigilância endoscópica, com o propósito de identificar e tratar precocemente focos de displasia epitelial ou mesmo envolvimento neoplásico numa fase ainda com potencial curativo.No que respeita ao follow-up do esófago de Barrett, as diretrizes atuais recomendam a realização de endoscopia digestiva alta de luz branca de alta-definição com biopsias aleatórias da mucosa esofágica, segundo o protocolo de Seattle, sendo posteriormente os doentes com confirmação diagnóstica encaminhados para um programa específico de vigilância endoscópica.A sensibilidade das biópsias aleatórias para documentar lesões de esófago de Barrett é de apenas 4-5%. Assim, têm sido recentemente desenvolvidas técnicas endoscópicas de imagem avançada, que aportam as vantagens de reconhecimento preciso de alterações subtis da superfície mucosa e possibilidade de recolha dirigida de biópsias esofágicas, reduzindo consequentemente os custos associados à análise histopatológica e a taxa de falsos negativos. Entre estas técnicas, destacam-se a cromoendoscopia ótica (eletrónica e convencional), endoscopia de autofluorescência e endomicroscopia a laser confocal. Esta revisão narrativa pretende, assim, abordar de modo transversal os principais aspetos relativos à Doença de Refluxo Gastroesofágico, ao Esófago de Barrett e à vigilância endoscópica deste último, reunindo a informação mais relevante e atual sobre o tema e procurando sumariar as orientações diretivas das várias Sociedades de Gastrenterologia.

Gastroesophageal Reflux Disease is one of the most relevant pathologies in gastroenterology clinical practice. Its estimated global prevalence ranges from 8% to 33%, with a tendency to increase, in an intrinsic association with the Western lifestyle.It occurs primarily as a disorder at the level of the lower esophageal sphincter, with the most important pathophysiological mechanism being the involuntary occurrence of transient episodes of relaxation of this sphincter.The continuous exposure of the esophageal mucosa to gastric acid causes inflammation in the esophageal mucosa and cellular alterations with the potential of malignancy, namely in the form of esophageal adenocarcinoma.Barrett's esophagus typically occurs as a chronic complication of this disease (especially if prolonged or untreated) and consists of the replacement of the squamous epithelium of the distal esophagus by cylindrical epithelium with goblet cells (intestinal metaplasia). It is identified in 7-10% of patients with chronic Gastroesophageal Reflux Disease and in 1-2% of the European adult population.It appears as a high-risk pre-neoplastic condition and represents a 30-40 times higher risk of adenocarcinoma (compared to the general population), therefore requiring a timely diagnosis and regular follow-up through endoscopic surveillance protocols, with the aim of identifying and treating early foci of epithelial dysplasia or even neoplastic involvement in a phase that still has curative potential.With regard to the follow-up of Barrett's esophagus, current Guidelines recommend performing high-definition white-light upper digestive endoscopy with random biopsies of the esophageal mucosa, according to the Seattle protocol, with patients subsequently referred with diagnostic confirmation. for a specific endoscopic surveillance program.The sensitivity of random biopsies for documenting Barrett's esophagus lesions is only 4-5%. Thus, advanced imaging endoscopic techniques have recently been developed, which bring the advantages of accurate recognition of subtle alterations on the mucosal surface and the possibility of targeted collection of esophageal biopsies, consequently reducing the costs associated with histopathological analysis and the rate of false negatives. Among these techniques, optical chromoendoscopy (electronic or conventional dye-based), autofluorescence endoscopy and confocal laser endomicroscopy stand out.This narrative review therefore intends to approach in a transversal way the main aspects related to Gastroesophageal Reflux Disease, Barrett's Esophagus and endoscopic Surveillance of the latter, gathering the most relevant and current information on the subject and seeking to summarize the Guidelines of the several Gastroenterology Societies.