Desenvolvimento e avaliação laboratorial e clínica de um Dispositivo de Distração da Articulação Temporomandibular para pacientes com diagnóstico de distúrbios articulares

Abstract

Introdução - Os deslocamentos do disco (DD) são a artropatia mais comum da Articulação Temporomandibular (ATM), provocando dor (em casos agudos), alterações do movimento e sons articulares. As abordagens conservadoras e de primeira linha recomendadas envolvem a intervenção do médico dentista (educação, farmacologia, goteira oclusal) e a fisioterapia. A técnica de distração condilar é um dos recursos fisioterapêuticos mais utilizados: visa aumentar o espaço entre o côndilo e a fossa articular, descomprimir a articulação e promover a adaptação dos tecidos e/ou a recaptação discal. É quase exclusivamente efetuada pelo terapeuta, repetida ao longo de um período extenso de tratamento (semanas a meses), de difícil execução manual pelo paciente. Objetivo - O objetivo deste trabalho consistiu no estudo, projeto, desenvolvimento e avaliação clínica de um dispositivo funcional com capacidade de efetuar e auxiliar os pacientes na manobra de distração condilar. Materiais e Métodos - Efetuámos uma pesquisa dos dispositivos atualmente existentes no mercado para fisioterapia mandibular (ou outros protegidos na forma de patente) que revelou que atualmente apenas existem dispositivos que visam aumentar a amplitude do movimento mandibular através da rotação, rototranslação e translação condilar. Nenhum dispositivo efetua distração articular, pelo que, em casos de DD agudo e dor retrodiscal, poderão inclusivamente ser contraproducentes. Analisou-se o enquadramento legal relativo ao desenvolvimento de um dispositivo médico, as normativas que regem o seu desenho, características e classificação. Posteriormente, iniciou-se a conceção, projeto e execução do protótipo funcional do dispositivo através das seguintes etapas: análise das condições clínicas de atuação e requisitos funcionais do dispositivo; obtenção de medidas anatómicas médias a partir de técnicas de segmentação de imagem e/ou levantamento de forma; desenvolvimento da geometria 3D através de um conjunto de protótipos funcionais até ao dispositivo final; estudo por elementos finitos do comportamento mecânico do dispositivo; maquinação, tratamento superficial e montagem do dispositivo; avaliação experimental em contexto de laboratório e ambiente clínico; avaliação e testes funcionais ao dispositivo. Foi possível obter um dispositivo com um desenho original e versátil, de fácil utilização e compreensão pelos pacientes. Iniciou-se o processo de pedido definitivo de Patente de Invenção Nacional, que foi aprovado com o nº 110605 e cujos cadernos finais foram posteriormente objeto de publicação no Boletim de Propriedade Industrial nº 167/2019. Iniciou-se, em Fevereiro de 2019, o Pedido de Patente Internacional na secretaria internacional da Organização Mundial de Propriedade Intelectual. Seguiu-se o Ensaio Clínico Randomizado do Dispositivo de Distração da ATM para pacientes com diagnóstico de Distúrbios Articulares. Assim, 40 pacientes com diagnóstico unilateral, pelos critérios RDC/TMD de DD com ou sem redução, com ou sem limitação de abertura (Grupo IIa, IIb ou IIc) e artralgia (Grupo IIIa) foram randomizados por um grupo de controlo (G1) submetido à terapêutica convencional (aconselhamento, medicação, goteira de reposicionamento anterior e fisioterapia com distração manual pelo fisioterapeuta) e por um grupo de teste (G2) submetido à terapêutica convencional (conforme o G1) e distração condilar pelo paciente em ambulatório com o distrator condilar. Os pacientes foram avaliados durante 90 dias, relativamente a um conjunto de variáveis físicas e psicossociais de dor e função mandibular. Resultados - O uso do distrator permitiu uma melhoria significativa na EVA I (dor em repouso) no G2 (-5.0±2.29cm) face ao G1 (-4.12±2.50cm), e diferente para o G1 aos 90d (p=0.005). A variação da EVA I indicou uma melhoria notória e imediata com a instituição da terapêutica com o distrator, bem como no intervalo 28-90 dias (o tempo mais longo de avaliação). O mesmo comportamento em função do tempo ocorreu para a dor em função (EVA II); o distrator permitiu que metade dos pacientes do G2 mudassem positivamente de diagnóstico (face a apenas 1/3 no G1); para as 3 aberturas as diferenças ao longo do estudo e os valores absolutos atingidos pelo G2 são sempre maiores do que no G1; o distrator permitiu melhorias estatisticamente significativas na perceção subjetiva da eficácia mastigatória e terapêutica; permitiu uma diminuição estatisticamente significativa do número de consultas de Medicina Dentária e Fisioterapia (p<0.001) e um menor custo (corrigido ao dia) do tratamento (p=0.024). Conclusões - O distrator revelou-se extremamente seguro, sem efeitos adversos graves. A introdução do dispositivo de distração articular no protocolo de tratamento de pacientes com diagnóstico de distúrbios articulares da ATM (subgrupo dos deslocamentos do disco) tornou essa abordagem uma alternativa e complemento válido a considerar na prática clínica diária do tratamento destes pacientes.

Introduction - Disc displacements (DD) are the most common Temporomandibular Joint (TMJ) arthropathy, causing pain (in acute cases), mandibular movement pattern impairment and joint noises. Recommended conservative and first-line approaches involve dentist intervention (education, pharmacology, occlusal splint) and physiotherapy. The condylar distraction technique is one of the most widely used physical therapy resources, aiming to increase the space between the condyle and the articular fossa, decompressing the joint and promoting tissue adaptation and / or disc recapture. It´s almost exclusively performed by the therapist, repeated over an extended period of treatment (weeks to months), and is difficult for the patient to perform manually. Objectives - The aim of this work was the study, design, development and clinical evaluation of a functional device capable of performing and assisting patients in the condylar distraction maneuver. Materials and Methods - We have researched the devices currently available on the market (or other patent protected) for mandibular physical therapy, and we found that there are only mandibular exercise devices that aim to increase the range of mandibular movement through rotation, rototranslation and condylar translation. No device causes joint distraction, so in acute disc dislocation cases (with retrodiscal pain) they may even be counterproductive. The legal framework regarding the development of a medical device, the rules governing its design, characteristics and classification were analyzed. Subsequently, the conception, design and execution of the functional prototype of the device were initiated through the following steps: analysis of the clinical conditions of operation and functional requirements of the device; obtaining average anatomical measurements from image segmentation and / or shape survey techniques; development of 3D geometry through a set of prototypes until the final device; finite element study of the mechanical behavior of the device; machining, surface treatment and mounting of the device; experimental evaluation in laboratory and clinical context; evaluation and functional tests of the device. It was possible to obtain a device with an original and versatile design, easy for patients to use and understand. We began the process of definitive application for a National Invention Patent, which was approved under nº 110605 and whose final notebooks were subsequently published in Industrial Property Bulletin nº167/2019. In February 2019, the International Patent Application was filed with the international bureau of the World Intellectual Property Organization. After, it was conducted a Randomized Clinical Trial of the Temporomandibular Joint Distraction Device for patients diagnosed with Articular Disorders. Thus, 40 patients with unilateral diagnosis by the RDC/TMD criteria of DD with or without reduction, with or without limitation of opening (Group IIa, IIb or IIc) and arthralgia (Group IIIa) were randomized by a control group (G1) undergoing conventional therapy (counseling, medication, anterior repositioning splint and manual distraction by the physiotherapist) and a test group (G2) undergoing conventional therapy (according to G1) plus condylar distraction in ambulatory by the patient with the distraction device. Patients were evaluated for 90 days for a set of physical and psychosocial variables of pain and mandibular function. Results – According to our study, the use of the distractor allowed a significant improvement in VAS I (pain at rest) in G2 (-5.0±2.29cm) compared to G1(-4.12±2.50cm), and statistically different at 90d (p=0.005). VAS I variation indicated a marked and immediate improvement with the establishment of distractor therapy, as well as in the range 28-90 days (the longest evaluation time). The same behavior (during the study time) occurred for pain in function (VAS II); the distractor allowed half of G2 patients to positively change their diagnoses (compared to only 1/3 in G1); for the 3 openings the differences throughout the study and the absolute values reached by G2 are always larger than in G1; the distractor allowed statistically significant improvements in the subjective perception of chewing and therapeutic efficacy; and a statistically significant decrease in the number of dentistry and physiotherapy appointments (p<0.001) and also a lower (corrected daily) cost of treatment (p=0.024). Conclusions – The distractor proved to be extremely safe without any serious adverse effect. The introduction of the joint distraction device in the treatment protocol of patients diagnosed with disc displacement joint disorders makes it a valid alternative and complement to consider in the daily clinical practice of treating these patients.