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https://hdl.handle.net/10316/27011
Title: | Contributos para o estudo da refutação em Português Europeu Contemporâneo | Authors: | Sousa, Sara Margarida dos Santos Feio | Orientador: | Lopes, Ana | Keywords: | refutação; retificação; relações discursivas; negação metalinguística | Issue Date: | 20-Mar-2015 | Citation: | SOUSA, Sara Margarida dos Santos Feio - Contributos para o estudo da refutação em português europeu contemporâneo. Coimbra : [s.n.], 2015. Tese de doutoramento. Disponível na WWW: http://hdl.handle.net/10316/27011 | Abstract: | O presente trabalho tem como objeto de análise a relação discursiva refutação e as construções em que esta é materializada em Português Europeu Contemporâneo.
Operando ao nível pragmático-funcional, a refutação pode ser definida como a relação que se estabelece entre um enunciado, da responsabilidade de um locutor B, cuja função é rejeitar um outro e o enunciado, da responsabilidade de um locutor A, que é alvo de refutação. Prototipicamente, esta relação ocorre em textos dialogais e constitui-se como um ato reativo negativo, ameaçador da face de ambos os interlocutores.
O segmento discursivo que desempenha esta função é tipicamente seguido de uma continuação discursiva que estabelece com este e com o enunciado alvo de refutação uma relação de retificação. Neste segmento, é apresentado, pelo locutor B, o elemento considerado mais adequado para substituir aquele que é alvo de refutação. Este segmento constitui-se igualmente como uma justificação da refutação levada a cabo.
Na base de uma refutação poderá estar um vasto conjunto de aspetos relacionados, em sentido lato, com as condições de aceitabilidade do enunciado alvo. Nas suas ocorrências mais prototípicas, a refutação terá por base o que é dito ou implicitado no referido enunciado. Nas suas ocorrências mais periféricas, esta pode ter igualmente por base aspetos de ordem formal, relacionados com a sua "correção" linguística. Em ambos os casos, no escopo de um enunciado refutativo não se encontra tipicamente a totalidade do enunciado alvo, mas determinados constituintes que conduzem à sua inaceitabilidade do ponto de vista do locutor que o refuta. Tais constituintes são tipicamente focalizados por processos de vária ordem, onde se destacam a negação de constituinte, as construções de clivagem e a entoação contrastiva. A compreensão destes processos de ordem sintático-prosódica só é possível à luz da função discursiva das sequências em que ocorrem.
Em Português Europeu, as sequências refutativo-retificativas podem moldar-se em dois tipos de construções paratáticas: construções de coordenação e construções de justaposição.
Em construções de coordenação, os segmentos refutativo e retificativo podem assumir a forma não p, mas q ou ainda as formas não p, mas sim/mas antes/e sim q, em que as conjunções mas e e, coocorrendo sistematicamente com os advérbios sim e antes, parecem ter-se especializado na marcação de um valor refutativo-retificativo. Estas construções são aceitáveis quer com refutações baseadas no que é dito ou implicitado no enunciado alvo, quer com refutações baseadas em aspetos formais.
Em construções de coordenação, os segmentos refutativo e retificativo podem ainda assumir formas especializadas na refutação de determinados aspetos do enunciado alvo, tais como a estrutura não só p, mas também q, especializada na refutação de aspetos atinentes ao conteúdo proposicional ou a Q-implicaturas associadas ao enunciado alvo, ou ainda as formas não é p, mas/mas sim/mas antes/e sim q e outras semelhantes, tais como não se diz p, mas/mas sim/mas antes/e sim q, especializadas na refutação de aspetos formais do referido enunciado.
Em construções de justaposição do tipo não p || q, a conexão entre os segmentos refutativo e retificativo não é realizada por nenhuma conjunção, não havendo também qualquer restrição relativamente ao tipo de elementos que podem estar na base da refutação levada a cabo.
Estas construções podem igualmente assumir formas especializadas na refutação de aspetos formais do enunciado alvo, como é o caso de não é p || é q ou outras de valor semelhante como não se diz p || diz-se q, ou ainda a forma p, não || q, que permite a refutação de enunciados negativos ou de enunciados não compatíveis com uma refutação do tipo não p || q. Em construções de justaposição, o segmento refutativo não é necessariamente realizado através de um enunciado negativo de caráter metalinguístico, tal como se verifica na generalidade construções refutativo-retificativas.
Em construções de justaposição, podem ainda ocorrer as expressões sim, antes ou pelo contrário, em estruturas do tipo não p || sim/antes/pelo contrário q. Neste contexto, estas unidades comportam-se como conectores ou marcadores discursivos que, não contribuindo para as condições de verdade das sequências em que ocorrem, fornecem instruções sobre o modo como a relação entre estas deve ser computada. As construções não p || sim, antes q, onde as unidades sim e antes permitem realçar, respetivamente, o contraste de polaridade e o valor preferencial do segmento que prefaciam, apenas são aceitáveis quando na base da refutação se encontra o que é dito ou implicitado no enunciado alvo. A construção não p || pelo contrário q, dado o valor antitético da expressão conectiva nela presente, apenas é aceitável quando na base da refutação se encontra o conteúdo proposicional do enunciado alvo e, mais especificamente, quando entre este e o enunciado prefaciado por pelo contrário existem dois predicadores distintos que estabelecem entre si uma relação de antonímia.
Em Português Europeu, estão ainda disponíveis outro tipo de expressões de natureza não conectiva que parecem igualmente ter-se especializado na marcação das relações de refutação e retificação, como é o caso das unidades lá, cá e agora (Martins, 2010) e da unidade nada, em construções do tipo [V_nada] (Pinto, 2011) que, em determinados contextos, parecem ter um valor inequivocamente refutativo, ou ainda da expressão mas é que parece constituir-se como um marcador de retificação. Estas unidades ocorrem predominantemente na oralidade, particularmente em registos informais, e o seu uso parece restringir-se aos casos em que, na base da refutação, se encontra o que é dito ou implicitado no enunciado alvo. The main purpose of this study is to analyse the denial or refutation discourse relation and the linguistic constructions that express it in European contemporary Portuguese. Operating at the pragmatic level, denial can be defined as the discourse relation that holds between an utterance, produced by a speaker B, whose function is to reject another utterance, the target utterance produced by a speaker A. Prototypically, this relation occurs in dialogues and functions as a reactive act, a face-threatening act that challenges the faces of both speakers. The text span that carries out this function is typically followed by a discourse continuation that corrects or rectifies the target utterance. In his/her corrective discourse move, the speaker B presents the information that, in his/her opinion, should replace what was previously rebutted. In its most prototypical occurrences, denial involves what is said or implied in the rebutted utterance. In its less prototypical occurrences, it can equally involve formal aspects of the rebutted utterance, associated, in a broad sense, with its linguistic accuracy. Typically, in both cases, it is not the entire utterance produced by the speaker A that is rejected, but only the constituents that lead to its unacceptability from the point of view of the speaker B. Such constituents are typically focused by a wide range of linguistic processes, such as constituent negation, cleft sentences and contrastive intonation. A comprehensive analysis of these syntactic and prosodic focusing processes needs to consider the discourse function of the sequences in which they occur. In contemporary European Portuguese, the denial and correction text sequences under analysis can be shaped into two types of paratactic constructions: coordination and juxtaposition constructions. In coordination constructions, the linguistic forms não p, mas q or não p, mas sim/mas antes/e sim q, seem to be specialized in the linguistic marking of the discourse relations at stake (denial and correction). These constructions can be used to reject not only what has been said in or implied by the target utterance, but also some formal aspects of its linguistic formulation. In coordination constructions, denial and rectification may also be expressed by the construction não só p, mas também q, which is specialized in the rebuttal of the propositional content or the Q-implicatures associated with the target utterance. Constructions such as não é p, mas/mas sim/mas antes/e sim q, não se diz p, mas/mas sim/mas antes/e sim q, seem to be specialized in the rejection of formal aspects of the target utterance. In juxtaposition constructions such as não p || q, the link between the text spans that refute and rectify the target utterance is not marked by any connective. There are no restrictions concerning the kind of element (propositional content, implicatures or formal aspects) that triggers the rejection of the target utterance. In the juxtaposition constructions, the denial and corrective text spans can also assume specialized forms when only formal aspects of the target utterance are involved. It is the case of não é p || é q or similar ones, such as não se diz p || diz-se q or p, não || q. It is worth stressing that in juxtaposition constructions, the denial text span does not necessarily take the form of a (metalinguistic) negative utterance. Finally, juxtaposition constructions also display structures such as não p || antes/sim/pelo contrário q. In this context, these expressions behave as discourse markers or discourse connectives. They give instructions on how to compute the discourse relation that holds between p and q. The constructions não p || sim/antes q, where the units sim and antes signal, respectively, the polarity contrast and the preferential value of the text span in which they occur, are only acceptable when what is being rejected is the propositional content or the implicatures associated with the target utterance. The construction não p || pelo contrário q, given the antithetical value of the connective pelo contrário, is only acceptable when what is being rejected is the propositional content of the target utterance. More specifically, this construction is only acceptable when, in the target utterance and in the utterance introduced by pelo contrário, there are two distinct predicates related by an antonymic semantic relation. In contemporary European Portuguese, there are other kinds of expressions (non-connective ones) whose function, in specific contexts, is also related with the conventional marking of the discourse relation of denial: lá, cá, agora (Martins, 2010) and nada, in constructions such as [V_nada] (Pinto, 2011), seem to have a clear denial marking function. Furthermore, the expression mas é may also signal the rectification/correction discourse relation. These expressions occur predominantly in oral interaction, particularly in informal registers, and their usage seems to be restricted to cases where what is being rejected is the propositional content or the implicatures associated with the target utterance. |
Description: | Tese de doutoramento em Língua Portuguesa, no ramo de Investigação e Ensino, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra | URI: | https://hdl.handle.net/10316/27011 | Rights: | openAccess |
Appears in Collections: | FLUC Secção de Português - Teses de Doutoramento |
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