Existir/Ocupar/Resistir: O corpo e a experiência de mulheres artistas no Brasil e em Portugal (Anos 60 e 70)

Abstract

Sob a ótica da ampla teoria feminista, discuto as experimentações de mulheres artistas com seus corpos durante os regimes autoritários no Brasil e em Portugal, entre as décadas 1960 e 1970, através das ideias de corpo político e arte de guerrilha. Recorri aos trabalhos das brasileiras Lygia Pape, Regina Silveira e Anna Maria Maiolino e das portuguesas Clara Menéres, Emília Nadal e Helena Almeida. Problematizo os processos de construção e reconstrução das narrativas em torno das experiências artísticas promovidas por mulheres entre as duas décadas. Mapeio a produção nos anos 1960 e 1970 e também as principais exposições de arte no Brasil e em Portugal, a fim de compreender a participação feminina no campo da arte e suas relações com o cenário internacional. Investigo a composição dos campos artísticos em ambos os países, através de leituras transversais de seus respectivos contextos autoritários. Elegi os termos “existir”, “ocupar” e “resistir”, que atuam como palavras de ordem para o agrupamento de obras entre as artistas portuguesas e brasileiras, na tentativa de construir narrativas em torno de cada uma dessas batalhas enfrentadas pelas mulheres em relação direta às teorias feminista das décadas de 1960 e 1970, bem como interpretações contemporâneas às problemáticas. O “Existir” tem a ver com o nascimento da mulher enquanto parte de sua própria história, num processo contínuo de auto(re)conhecimento, que é, sobretudo, uma atitude política. Em “ocupar” lido com as questões referentes aos papéis sociais atribuídos às mulheres e aqueles conscientemente escolhidos por elas, uma vertente mais social/sociológica para o assunto. Já em “Resistir”, trato do lado combativo/visceral que as mulheres encontraram para abalar as estruturas sexistas e misóginas que configuraram e ainda configuram toda uma lógica de pensamento que é falogocêntrica. Cada uma, em seu universo próprio, que é público-privado, usaram de seus corpos como artistas e do corpo como re(a)presentação de questões inerentes ao “ser mulher”, enquanto categoria e como matéria viva.

Through a wider feminist theory perspective, I discuss the women artists' experiments during authoritarian regimes in Brazil and Portugal, between the 1960s and 1970s, using the ideas of a political body and guerrilla art. I resort on the works of Brazilian artists: Lygia Pape, Regina Silveira, Anna Maria Maiolino and Portuguese artists: Clara Menéres, Emília Nadal and Helena Almeida. I discuss the construction processes and narrative reconstructions around the artistic experience promoted by women in the last two decades. I map the production in the 1960s and 1970s and the main art exhibitions in Brazil and Portugal, in an attempt to understand the female participation in the field of art and its relations with the international scene. The composition of the artistic fields in both countries is investigated, through transversal readings of their respective authoritarian contexts. I chose the terms “exist”, “occupy” and “resist”, which act like words of order for the groupings of works belonging to the Portuguese and Brazilian female artists, in an attempt to construct narratives around each of these battles faced by women in direct relation with feminist theories of the decades 1960 and 1970, as well as contemporary interpretations to the problematics. The “Exist” has to do with the woman's birth as part of her own story, in a continuous process of self-(re)cognition, which is, mainly, a political attitude. In “Occupy”, I deal with questions related with the social roles assigned to the women and those who consciously were chosen by them, a side more social/sociological for the matter. Finally, in “Resist”, I deal with the combative/visceral side women found to shake the sexist structures and misogynist which configured and yet still configure a whole logical thinking which is phallogocentric. Each one, in its own universe, which is public-private, used their bodies as artists and the body itself as a re-introduction of the questions related with “Being a Woman”, not only as category but living matter.