Reflexões sobre ciência e a produção do conhecimento científico na percepção de docentes e discentes no ensino superior

Abstract

As concepções de ciência e a busca incessante por conhecimento ainda se apresentam como temas complexos, polêmicos, amplos e atuais, visto que paradigmas inovadores debatem as possibilidades e limites do conhecimento científico, evidenciando uma certa ruptura epistemológica com os requisitos do conhecimento proveniente do enquadramento positivista. Com o Processo de Bolonha, as instituições de ensino superior tiveram de adaptar, no âmbito da sua missão e do paradigma da aprendizagem ao longo da vida, visões e metodologias, passando a enfatizar abordagens centradas na aprendizagem dos estudantes. É emergente a necessidade de mudanças nos processos educativos no ensino superior, nas dimensões científica, pedagógica e humana, atendendo aos desafios sociais atuais. Este estudo enfatiza a abordagem humanista por ser uma proposta que defende a investigação que tem sido predominante nas ciências humanas, onde a relação estabelecida é do tipo sujeito-sujeito sendo o “objeto” outro sujeito, o que aponta para a possibilidade de mudanças, no contexto universitário, sobre conceções de ciência e de ensino. A educação com uma práxis pedagógica que contempla aprendizagem para vida contribui para o desenvolvimento da autonomia e do pensamento crítico de quem aprende e também de quem ensina. Assim, definimos como objetivo principal desta tese obter uma compreensão aprofundada das concepções dos participantes acerca da ciência e da construção do conhecimento científico, e como ocorre a promoção da autonomia através das estratégias de ensino-aprendizagem, do ponto de vista dos sujeitos participantes. A parte empírica desta tese se desenvolveu na Universidade de Coimbra, abrangendo quatro cursos da área das ciências sociais e humanas, tendo como participantes docentes e discentes dos 1os e 3os anos dos referidos cursos de graduação, os quais foram inquiridos, numa primeira etapa, através de questionários com o objetivo de caraterizar a sua sofisticação epistemológica, de modo a assegurar um conjunto heterogêneo de pessoas para a segunda e principal etapa do estudo, que consistiu na realização de dezenove entrevistas semi-estruturadas em profundidade, 9 a docentes e 10 a estudantes. A pesquisadora-entrevistadora ouviu os protagonistas do estudo em discurso direto, a partir do ponto de vista que estes têm em relação à própria experiência vivenciada no contexto universitário acerca das seguintes temáticas: conhecimento científico; formação e competência do investigador; relação entre ciência e ensino aprendizagem; abordagens holísticas na compreensão do humano no processo educacional. Trata-se de uma investigação com uma componente fenomenológica importante, crítica, capaz de a partir da experiência reflexiva e subjetiva das pessoas entrevistadas, dar conta de dimensões do vivido humano e seus significados da vida real. O paradigma fenomenológico traz em seu cerne a integração, a inter-relação consciência-mundo, sujeito/objeto. Todo material transcrito e analisado das entrevistas respeitou os fundamentos dos passos metodológicos descritos por Forghieri (1997), seguindo as etapas de redução fenomenológica, tendo sido compreendido e interpretado pela pesquisadora segundo as fases de envolvimento existencial e distanciamento reflexivo, constituindo resultados de uma interpretação compreensiva da realidade vivida e a explicitação da natureza do fenômeno estudado. A análise dos dados foi efetivada de acordo com a sistematização da metodologia proposta por Amatuzzi (2001), descrita em quatro momentos: organização dos relatos, sistematização da síntese específica e geral, discussão dos resultados e comunicação do fenômeno. Desenvolvemos este trabalho com a certeza de que a produção e utilização do conhecimento devem contribuir para a evolução do ser humano em todas as suas dimensões, e que o desafio está em romper com a estruturação dicotômica entre teoria e prática na universidade. Com este trabalho queremos deixar reflexões e sugestões para a (re)organização da docência e das práticas de investigação da universidade, partindo da perspectiva de quem aprende e de quem ensina, da sua subjetividade e das suas experiências vividas.

The conceptions around science and the unrelenting search for knowledge still present themselves as complex, controversial, broad and current issues, since innovative paradigms have debated the possibilities and limits of scientific knowledge, evidencing a certain epistemological rupture with the requirements of knowledge coming from the positivist framework. After the Bologna Process, higher education institutions have had to adapt their visions and methodologies, within their mission and the lifelong learning paradigm, emphasizing approaches centered on student learning. There is an emerging need for changes in the educational processes within higher education, in scientific, pedagogical, and human dimensions, given the current social challenges. This study emphasizes the humanistic approach because it is a proposal that defends the research which has been predominant in the human sciences, where the established relationship is one of the subject-subject type with the "object" being another subject, which points to the possibility of changes in the university context as well as on conceptions of science and teaching. Education counting on a pedagogical praxis that contemplates lifelong learning, contributes to the development of autonomy and critical thinking of those who learn but also of those who teach. Thus, we defined as the main objective of this thesis to obtain a deeper understanding of the participants' conceptions about science and the construction of scientific knowledge, and how the promotion of autonomy through teaching-learning strategies occurs, from the point of view of the participating.The empirical part of this thesis was developed at the University of Coimbra, covering four courses in the area of social sciences and humanities. The participants were teachers and students of the first and third years of the undergraduate courses who were surveyed in a first stage through questionnaires aiming at characterizing their epistemological sophistication, in order to ensure a heterogeneous set of people for the second and main stage of the study which consisted of nineteen semi-structured in-depth interviews, 9 of them with teachers and 10 with students. The researcher-interviewer listened to the protagonists of the study in direct speech, from the point of view that they have in relation to their own experience in the university context about the following themes: scientific knowledge; training and competence of the researcher; relationship between science and teaching-learning; holistic approaches in the understanding of the human in the educational process. This is an investigation with an important phenomenological and critical component which is able to contemplate the dimensions of the human experience and its real-life meanings based on the reflective and subjective experience of the people interviewed. The phenomenological paradigm brings at its core the integration, the inter-relation conscience-world and the subject/object. All the material transcribed and analyzed from the interviews respected the fundamentals of the methodological steps described by Forghieri (1997), following the stages of phenomenological reduction, and was understood and interpreted by the researcher according to the phases of existential involvement and reflexive detachment, constituting the results of a comprehensive interpretation of the reality experienced and the explicitness of the nature of the phenomenon studied. The data analysis was carried out according to the systematization of the methodology proposed by Amatuzzi (2001) and described in four moments: organization of the report; systematization of the specific and general synthesis; discussion of the results and communication of the phenomenon. This work was developed assuming as true that the production and use of knowledge should contribute to the evolution of the human being in all its dimensions, and that the challenge lies in breaking with the dichotomous structuring between theory and practice at the university. This thesis might imply reflections and suggestions for the (re)organization of teaching and research practices at the university, starting from the perspective of those who learn and those who teach, their subjectivity and their lived experiences.